Amor ou Posse, por Juliana Barreto

Ao longo dos tempos foram estabelecidos critérios para a sobrevivência feliz do ser. Isso é parte do que constitui o humano. Assim pressupomos que a vida em sua finalidade e sentido, deveria ser gozada, e em tempos atuais esse gozo casou-se com a posse, em suas mais variadas vertentes, que atenderia todas as exigências tornando-as possíveis.

No âmbito social é cada vez mais notório o apego às formas de possuir, embora muitos já considerem que a tal não  pode ser considerada responsável pela felicidade. As escalas de valores se alteram de acordo com os empreendimentos, juros e câmbios tornando-nos inquietos. As possibilidades de viver com aquilo que está ao alcance estão cada vez mais escassas. Nos é inerente o “conquistar”. Mas a medida que os dias passam penso ser insuficiente ressignificar conceitos apenas, pois também nos tornamos habilidosos com as palavras e conjecturamos entre eles.

Mas em se tratando de posse, tem me inquietado nesses últimos dias a busca por este nas relações envolvidas por aparente complacência, compaixão e misericórdia, explícita -ou não- no trato com aquele que chamamos de próximo, e tudo o que envolve essa relação direta -ou não – e todas as articulações que antecedem esse contato tornando-o natural -ou não-. O quanto o vejo pessoa ou propriedade, e o quanto posso me apoderar dela em seu sofrimento, e o quanto isso me é tocante quanto à inerente inclinação ao prazer de conquistar. Em se tratando de maneira indireta, o quanto do eu, minha necessidade de prazer, conquista, controle, apoderamento e posse está no cinza do pano de fundo do que cuidadosamente articulei para aproximar-me, que se examinado a olho nu talvez trate do apropriar-me dele ou ao menos de sua historia. Desejos imperiosos tão antigos quanto a própria humanidade, que de tão reconceituados -ou não- misturam-se às cores de nossas novidades discursivas tomando um novo formato, mais elegante, aceitável e convincente. Adequado a toda a minha necessidade de realização, controle e posse.

Meus pensamentos recorrem a questionamentos profundos sobre essa forma gananciosa de amar. Minha investigação é quanto a essa versão humanista de amor, que me coloca no centro e subtrai todo o valor dessa relação direta -ou não – que nos rouba a surpresa e a vulnerabilidade.

Talvez meu espanto me dirija a maneiras mais simples de me aproximar, onde o grito da alma humana que apela por conquistar seja calado de maneira nobre e honesta, desprovida do desejo pelo prazer por possuir o que quer que seja, para, quem sabe assim não seja mais necessário ressignificar o amor, e este se bastaria.

 Juliana Barreto é quebradeira da 4ª edição da UQ

Foto: Cécile Graat