Aos nossos filhos – por três olhares quebradeiros

Sandra Maya

Excelente texto construído em torno dos preconceitos que, mesmo velados, ou não reconhecidos, existem. No nosso dia a dia condenamos quem tem preconceitos contra gays, falamos de pessoas que execram lutas armadas e guerrilheiros, mas quando os “problemas” batem a nossa porta o comportamento muda. Querer ser diferente da maioria, achar que tudo é certo e aceitável quando não é dentro de nossa casa é fácil. Mas quando temos que conviver no dia a dia com uma situação que não se enquadra no que é convencional, aí o preconceito aflora. E isso é levado a público de maneira visceral e dramática, sem ser melodramática. A contenda entre as personagens mostra o egoísmo. Na hora de opinar sobre o comportamento ideal, assumimos um padrão de vida e temos medo de contestá-lo.

Na peça, Tania, a personagem gay, que condena a mãe por negligência e falta de tempo para ela, tem medo de se assumir para a família, o que lhe traz 15 anos de um relacionamento cheio de culpas e angústia. E Ana, sua mãe, que levou a vida defendendo causas políticas e sociais com unhas e dentes, mas nunca deixando de amar e se preocupar com os filhos, não mediu as consequências de seus atos na vida deles. Contudo, apesar da troca de insultos e culpas, o amor é maior, e de todas as horas ruins afloram as lembranças de bons momentos vividos.

A peça faz-nos sentir e viver o problema, refletir sobre o certo e o errado.

A realidade nada mais é do que aceitar as pessoas como são, com sua opção de vida e seus sentimentos, respeitar suas escolhas e amá-las por sua essência.

por José Carlos Soares

Gostei da peça, embora tenha achado um pouco longa, para um texto um tanto simples (o que não é necessariamente um problema). Na minha percepção momentânea, achei que dava umas voltas desnecessárias, mas pensando friamente depois, vi que foi coerente — já que era um debate acalorado, normal que fosse assim. Ainda sobre o texto, aborda temas interessantes como o preconceito, o conflito de gerações, o já tão de(batido) tema da ditadura, mas a necessidade, ou melhor, a tentativa de parecer didático, me cansou algumas vezes. As atrizes eram muito boas, em especial a Maria de Medeiros.
O figurino me pareceu simples, nada muito esdrúxulo, que chamasse a atenção, assim como a luz intimista. Achei bacana a presença do pianista no palco junto a elas em alguns momentos, ainda que ele não participasse da parte textual da trama, e ótimas as pontuações musicais que aconteceram durante a peça. Era uma música bonita.
O cenário era interessante. Assim que entrei na sala, tive a sensação de um aspecto lunar. Mas depois, vendo alguns detalhes, me pareceu mais um lugar abandonado, como uma construção, talvez. Tinha o aspecto de um lugar sendo corroído, se desgastando. Esta construção do cenário me pareceu análoga à relação entre mãe e filha, embora, no final, elas tenham se reconciliado, ainda que momentaneamente, e a peça tenha um desfecho em aberto, com a mãe contando uma história sobre outro tempo, outro lugar, amenizando a tensão que predominou por noventa minutos. O final, entretanto, não aponta para uma concordância entre as duas sobre os temas abordados, já que as duas tinham opiniões muito firmes e destoantes, que geraram conflitos tragicômicos, apesar da seriedade dos temas.
Enfim, gostei de ter visto, foi uma oportunidade bacana, valeu a pena ter ido. De modo geral, gosto mais de ler uma peça do que ver uma encenação. Pra ser honesto, não tenho muito o hábito de ir ao teatro, se vou três vezes por ano é muito. Não conhecia o texto, e até pouco antes da peça começar, nem sabia sobre o que se tratava! Mas de modo geral, gostei.

por Sandra Lima

Numa análise pessoal, percebi uma mensagem contida no contexto geral
do espetáculo: o cenário feito com rolhas de garrafa contém uma
mensagem futurista, demonstrando uma preocupação com o futuro
do planeta, e as novas gerações. “Aos nossos filhos”, o que estamos
deixando a eles?
A visão preconceituosa da mãe sobre a relação homossexual e da filha,
sobre o HIV levanta a questão sobre o que estamos ensinando
de novo “aos nossos filhos”.
Duas gerações ali representadas, e ambas carregando em si seus
preconceitos, frustações e limitações.
O passado e o presente o tempo todo sendo confrontados nos diálogos
em que ora a comunicação é feita por computador, ora por carta.
É como se nos mostrasse ali que uma revolução verdadeira caminha
com a evolução. Quando deixamos de olhar para trás,
e seguimos adiante, lançando fora conceitos que de nada servem.