Gata amarrada em saco de pano, por Vanessa Pequeno

Quero o verbo rasgado. A poesia em carne viva
A palavra nua e crua. Despida de qualquer pudor.
Quero o sangue que jorra dos pulsos abertos.
Verborragia em fluxo! Impulsos poéticos!
Quero o que se forma antes do pensamento tomar forma.
Quero a sensação! Livre de qualquer amarra.
Quero transgredir não só a Norma Culta, mas a burocratização da expressão.
Não quero seguir uma linha reta, pois a própria vida não a segue.
Quero pisar em meus pés, em meus próprios calos!
Tropeçar nas pernas embriagadas das minhas linhas mal traçadas.
Quero escrever da forma que me der na telha. Dançar as palavras de acordo com a música que eu escuto…

Amostra de processo criativo da peça gata amarrada em saco de pano, de Vanessa Pequeno, com direção de Marco Andrade, pelo Grupo A Casa Voadora, com Cristiana Carvalho, Maria Júlia Garcia e Vanessa Pequeno, dentro da primeira edição da mostra Encena – Desvendando o Processo na Galeria TAC no Centro do Rio, em 15/6/2012.

A poesia perdeu a cor. Decidi não comentar pra não espalhar desencanto.
Todo mundo percebeu. E tinha como esconder? Não teve jeito, o estrago estava feito…
Êita, que chororô!
Romarias e procissões se seguiram aquele funesto dia…
– Diabo é isso? Que mandinga é essa debaixo da minha janela? Fumo de rolo, vela…
– Ela se apaixonou por um tal de amor não correspondido.
– Dor de amor não sara assim…
– Sim, só com outro amor se cura, já dizem por aí…
– Ainda não me acometeu essa tal de “paixonite”, por isso, sei que é fácil falar.
– Arrume outro homem que dê jeito nesse fogo todo que tem debaixo da saia!
– Ai! Ai! Tenham dó de mim, que não consigo mais viver sem ele. Cada dia que passa, sinto mais saudade. Depois que descobri o sabor daquele beijo, daquela boca…
– O caso é darmos um jeito de nos vermos às escondidas.
– Venha que já não é sem tempo!
Porém, tudo no começo são flores, como se diz no provérbio popular.
– Arrumei foi sarna pra me coçar.
– Artista acha que sobrevive de vento.
– Todo mundo diz que amor não enche barriga. Enche não? Então o que é esse bacurizinho na minha? Acho que engoli a lua quando fiz amor com ele…

Vanessa Pequeno
Foto de Ticiana Masset