Literatura Pop

Você é um escritor do século retrasado que mora numa pensão e tem alguns trocados no bolso. Ou quem sabe um ricaço dos dias de hoje, que está prestes a botar tudo a perder. Não consegue se enquadrar num emprego comum, e muito menos acreditar nas diretrizes básicas que regem uma sociedade. Vive sob sua própria moral; livre de dogmas religiosos, políticos e filosóficos. Por mais que tente se enquadrar está longe de pertencer a algum grupo. Mesmo perto de seus iguais marginalizados. Assim como eles, você ronda a margem, mas diferente deles, não apenas socialmente. E o que você mais faz na vida é flanar. Você é um flâneur. Um serendipitoso. Alguém que anda por aí e que aprende com a experiência da observação. É um observador da vida igual a um ator em seu laboratório. Na verdade você luta para ter apenas uma coisa, tempo. Pois descobriu que o tempo é a única coisa que realmente importa. Mesmo quando o tempo esbarra na contraditória questão da sobrevivência. Você é um perdedor nato. Um fracassado. Mas não porque foi derrotado, e sim porque desistiu de lutar. Você é uma espécie de homem adolescente que vive acorrentado às questões do passado, e que se recusa a crescer para não perder a inocência que te afasta desse mundo limitado. Aonde o final é sempre o mesmo. Vazio, vazio e vazio. E por mais que busque a solução de tudo isso, ou seja, da vida, a única coisa que você realmente sabe, é que esse vazio se apresenta porque o ser humano não consegue superar a morte. Não há nenhuma maneira de preenchê-lo. E o único jeito de se resolver esse problema, é deixando ele de lado. Os vícios e a busca pelo prazer hedonista também não te apontam uma fuga confiável. Nem a mulher que você escolheu para ser a tua musa inalcançável, colocada em um pedestal. Embora algumas vezes ela possa se manifestar de forma segura, você sabe que no momento da conquista, a “mocinha” perde qualquer importância que já tenha tido. Não por causa dela, e sim porque as coisas são assim. Mesmo que a gente não saiba por quê. Sabe que não é capaz de amar o corriqueiro. Se você identificou um personagem com esses traços em algum livro, saiba que ele está presente em vários livros de diferentes escritores, épocas e países. Pois essas são algumas das características da famigerada literatura pop. E o pop aí, diferente da conotação pejorativa, remete às fortes influências da cultura de massa. Não necessariamente descartável. E a uma questão de estrutura e linguagem dinâmica apresentada nesses livros, que se aproximam mais da língua falada nas ruas do que da norma culta. Com escritores predominantemente homens, mas com representantes femininas. Esses personagens dos grandes centros urbanos em sua maioria, podem ser encontrados, polemicamente defendo, até em alguns clássicos da literatura mundial. E vários estilos como noir, beatnik, policial, gonzo, ficção científica, cyberpunk, marginal, brat pack e etc. Muitos escritores contemporâneos escrevem desse ponto de vista, constantemente em primeira pessoa e introspectivo, e provavelmente irão detestar esse tipo de alusão ao seu nome. Ainda mais com a famigerada palavra pop enfurnada ali no meio. Pois assim como os seus personagens, eles devem odiar os rótulos. E com toda a razão.

Alguns livros:

Lolita Pille: Hell
Marcelo Rubens Paiva: Blecaute
Charles Bukowski: Misto Quente
Henry Miller: Trópico de Câncer
Irvine Welsh: Trainspotting
Nick Hornby: Alta Fidelidade
Douglas Coupland: Geração X
Machado de Assis: Dom Casmurro
Dostoievsky: Crime e Castigo
Breat Easton Ellis: Abaixo de Zero
Alex Garland: A Praia
F.Scott Fitzgerald: O Grande Gatsby
Chico Buarque: Benjamin
Mario Vargas Llosa: Batismo de Fogo
Jack Kerouac: Pé Na Estrada
David Goodis: A Garota de Cassidy
Hunter Thompson: Diário de um Jornalista Bêbado
Jay Macinerney: Brilho da Noite, Cidade Grande
Marcos Rey: Memórias de Um Gigolô
John Fante: Pergunte ao Pó
J.D. Salinger: O Apanhador no Campo de Centeio
Ken Kesey: Um Estranho no Ninho
Phillip K. Dick: O Caçador de Androides
Kurt Vonnegut: O Café da Manhã Dos Campeões
Knut Hamsun: Fome

por Delano Valentim

 

Foto: montagem sobre arte original de Suélen Brito