Olhos Abertos por Shirley Rodrigues

Gostaria de escrever brevemente, sobre como os encontros da UQuebradas , tem influenciado e me  estimulada a escrever,  através da experiência da convivência com o coletivo das Quebradas.

Mês passado participei do Festival de esquetes do Niterói em Cena, e recebi uma Menção Honrosa pelo Texto Teatral Mangala que narra: O Drama das mulheres viúvas na Índia, abordando os aspectos culturais, econômicos e humanos. De forma delicada e suave, mostrando a situação periférica e marginal do país na década de 30. Foi muito gratificante, para poder continuar e investir na escrita como processo de construção crítica e de crescimento humano.

Lembro-me de quando me perguntaram nas entrevistas o que eu esperava das Quebradas , eu disse que não tinha condições de entrar em um edital e que queria produzir cultura, e gostaria de descobrir que caminhos são esses, que eu poderia estar percorrendo, perguntei quem seriam essas pessoas e como elas fazem para se produzir. E depois de cinco meses, estou muito feliz com as novas descobertas e caminhos trilhados por cada um dos Quebradeiros. Estou em um processo de busca e construção.

E sobre o que as Quebradas tem me ” provocado“, segue o texto Olhos Abertos:

E continuava a acordar todas as noites na tranqüilidade da madrugada, com sua alma inquieta a procura de repostas para um saber ainda desconhecido, mas que lhe tirava o sono.

As luzes  brilham intensamente e parecem não ter fim ao olhar pela janela de seu quarto, cheia de grades, através da qual sopra um vento fresco típico da época do ano.

Se pergunta : Quem sou eu ?

Percebe que ainda está a procura de respostas.

Ouve leves gargalhadas e passos cambaleantes que parecem se aproximar cada vez mais e olha em direção a esse som que chama por ela. Vê jovens andando pelas ruas livremente em profunda alegria e pensa: Será apenas um refúgio na madrugada quieta e fresca que os acompanha? Ela ainda não sabe.

Por um momento pensa em acender a luz do quarto, mas logo desiste e prefere olhar,  apenas olhar, as várias luzes, com seus passos cambaleantes, que se perdem do seu olhar na janela. Tem certeza que em cada lugar que elas brilham , estão cheias de histórias de pessoas ocultas , que são reveladas delicadamente em seu imaginário .

Debruça-se sobre a janela, e agora, os seus olhos estão voltados para esses jovens que nesse momento estão sentados na calçada, e fica observando como estão completamente dominados por uma alegria que parece incontrolável.

Olha para o relógio de seu quarto, que marca a hora da madrugada, e se pergunta: Porque as pessoas ficam tão quietas em suas casas com as luzes acessas e solitárias , parecendo chamar uma companhia em plena silêncio, será mesmo que estão dormindo?

Pensa que não, e ri para si mesma.

O momento do silêncio é a hora que as luzes mais brilham.

O brilho dessas luzes parecem retomar seu sono novamente. Boceja. Caminha pelo quarto e pensando em se jogar na sua cama, que guarda os segredos de todas as noites, é despertada por um grito agressivo.

Volta à janela, e percebe que o grito que parecia ser agressivo, é apenas uma das várias tentativas dos jovens  levantarem-se apoiando uns nos outros. Fica ali observando, e depois de algum esforço, eles conseguem se levantar e seguem com suas pernas cambaleantes até chegarem ao seu destino, pelas ruas que brilham suas luzes intensamente.

Ela,  sabendo que todas as noites quando acordar, tomada pela insônia, e olhar na sua janela, as luzes estarão ali, demora mais alguns minutos e já não se percebe mais. Foi vencida pelo sono. E amanhã …. amanhã as luzes brilham novamente.

Arte: Toinho Castro