Pré-aula – Linguagem e expressão dia 21 de agosto

Você sabia que a nossa língua é hoje a sétima ou talvez a sexta mais falada no mundo? E o que você acha das diferenças no modo de falar que podem ser percebidas de uma região para outra aqui no Brasil? Que relação se pode estabelecer entre a língua e a história de um povo? Na próxima aula, Sandra Portugal e José Henrique querem conversar com você sobre a história da Língua Portuguesa e como é importante entender o sentido das palavras. A variedade culta da nossa língua, ensinada nas escolas, também será tema da próxima aula.

Aproveite para ler dois poemas que serão trabalhados em sala:

Procura da poesia.

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

(Carlos Drummond de Andrade)

 

Sabiduria de matuto

Doutô, cum sua licença:
Cada quár diz o que sabe,
eu vô dizê o que sei.
Seu criado é anarfabeto
num intende dos decreto
das manha que tem a lei.

Tem medo, pra que negá,
dos castigo da justiça
da pena dos iscrivão.
Infrento inté prijuízo…
s’é de perdê o juízo
mió perdê a questão.

Seu doutô sai piquinino
pra istudá na cidade,
a gente fica no mato.
Disinvorve a intiligença,
quando vorta tem sabença
pra passá bolo num rato.

Nói não pudemo istudá.
Vivemo na sujeição
dessa madrasta: a pobreza!
Se arguma coisa sabemo
é somente o qui aprendemo
nesse livro: a natureza!

Porém, doutô, nós matuto,
samo pão da mesma massa
qui fizero vasmicê.
A diferença mardita
é as lêta qui tão iscrita
qui a gente óia e não lê.

Muitas coisa a gente aprende
cum ocilo do Divino,
sem percisá de istudá.
Leve im vista os passarin:
quando crece sai do nin…
quem l’insinô a vuá?

Meu Siridó. José Praxedes Barreto (Zepraxédi)